quarta-feira, 16 de julho de 2014

Histórias do Paraná - O profeta de Antonina

Histórias do Paraná - O profeta de Antonina

O profeta de Antonina
Valêncio Xavier

Desde o Monge da Lapa, que muita gente acredita ainda estar vivo, o Paraná é terra fértil para monges, profetas,
benzedores e curadores.
Em Antonina, o túmulo do Profeta da Costeira até hoje é motivo de romaria.
Basta deixar uma garrafa d’água em cima do túmulo, a água começa a ferver e, dizem, passa a ser um santo remédio
para qualquer mal.
Aguinaldo Vieira da Silva nasceu em Penedo, Alagoas, em 1914. De família pobre, era paralítico.
Quando estava com uns doze anos de idade, o menino Aguinaldo embarca de carona num navio e é deixado em Paranaguá.
Pede esmola e engraxa sapatos com muita dificuldade, pois só pode movimentar uma das mãos.
Aos dezessete anos, Aguinaldo mora de favor junto com uma velha senhora, também entrevada.
Moço bonito, longos cabelos sedosos, rosto de moça, Aguinaldo é mais um dos tantos miseravinhos que vegetam em Paranaguá.
Uma noite, voltando sonado para o casebre onde mora, vê, ou sente, a presença de um velho de longas barbas brancas.
Apesar das roupas esfarrapadas do velho, Aguinaldo lhe pede uma esmola:
Eu posso dar uma esmola sim, mas posso curar e dar a você o poder da cura.
O que você prefere? Aguinaldo não aceita a esmola.
Aquele velho seria, dizem, um milagreiro que desde tempos imemoriais aparece em Paranaguá.
Transtornado, Aguinaldo cai num sono profundo.
Acorda pela manhã, em seu barraco, completamente curado.
Ali mesmo realiza seu primeiro milagre: cura a velhinha entrevada que lhe dava guarida.
Os médicos parnanguaras não ficam muito satisfeitos com o novo concorrente.
Contam que moleques eram pagos para jogar pedras no barraco de Aguinaldo e ele acaba sendo preso por exercício ilegal
da medicina. A mulher do delegado sofria de enxaqueca, dessas que não saram nunca.
Com um simples copo d’água benzido, Aguinaldo cura-a para sempre e é liberado da prisão.
Apesar da fama, as coisas nunca vão muito bem para Aguinaldo em Paranaguá, muita perseguição.
Trazido a Antonina para curar um alcoólatra da família Cabral, acaba se radicando na Costeira, como um membro da família.
Fica muito amigo de Reginaldo Cabral, de sua idade, que será seu companheiro até o fim da vida.
Vem gente de todos os lugares procurar a cura e os conselhos do Monge da Faisqueira:
"eu era menininha, estava afogada com um osso de galinha na garganta, não conseguia respirar.
Minha mãe me levou ao Monge Aguinaldo, ele me deu farinha misturada com água e o osso pulou fora.
Devo minha vida a ele", diz Dona Rosinha, dona da tradicional restaurante que leva seu nome em Antonina.
Em junho de 1933, Aguinaldo morre.
Com tanta gente que veio de fora, foi o maior enterro visto em Antonina.
Na porta do cemitério, tiram uma foto que mostra o morto com os olhos entreabertos.
Afirmam que os abriu, na hora da foto, para abençoar quem tinha vindo ao enterro.
A foto vai gerar a crença que ele não morrera de fato.
Anos mais tarde corre o rumor que estava "corpo santo", crendice brasileira de que o corpo das pessoas santas conserva-se integro depois da morte: corpo seco.
Pedem a exumação, centenas de pessoas vieram ver o milagre.
Abre-se o caixão, o corpo está decomposto, mas a fé de Aguinaldo não morre.
Ainda hoje, pode-se ver gente rezando no seu túmulo azul cor do mar, pedindo ajuda.

Valêncio Xavier, escritor e historiador


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